A Guerra Colonial, que ceifou milhares de vidas e deixou outras tantas com deficiências profundas, também levou muitos de nós a perceber a existência de outras realidades “escondidas” com a bandeira das Quinas.
Na grande capital de Angola, Luanda, como em tantas outras cidades do interior, as suas populações viviam em comunidade e surpreendiam todos quantos chegavam, pois as atividades comerciais e industriais estavam num “galopante” desenvolvimento. Havia até restaurantes que não encerravam as suas portas, bares e discotecas às dezenas, cujo horário de funcionamento era até ao amanhecer…
Aprofundando o querer, dava para entender que na sua maioria, essa Guerra Colonial era mantida por interesse de muitos dos seus militares do quadro e patentes superiores. Pouca população civil intervinha na defesa dessa guerra. Nalguns casos, era corrente a linguagem de uma defesa desnecessária(?). E estou a escrever sobre Angola, onde prestei o meu serviço militar.
A expansão da guerra não se fazia nas cidades ou vilas, estava muito restrita ao “mato”. Aí o ódio que se gerava entre os partidos para a independência – FNLA, UNITA, MPLA E UPA – e as Forças Armadas Portuguesas sustentavam parte de uma guerrilha sem vencedores. Não tenho recordações de dramas com armas (Na minha guerra não havia dessas m****s!). Estive na Força Aérea, numa missão mais citadina e pedagógica.
O cosmopolitismo de Luanda deixava em todos nós um ar de espanto, pela sua grandeza. Tive o privilégio de viver ali alguns anos, dos quais tenho excelentes recordações e uma saudade que não se apaga, de dezenas de amigos que se dispersaram após a independência. Mas a vida merece continuidade e valorização.
A evolução de Angola estava retratada nos excelentes transportes rodoviários, ferroviários e aéreos, que uniam esse enorme território. A censura, quase inexistente, permitia a circulação de jornais e revistas com alguns artigos “suspeitos”. Na rádio local, escutavam-se canções “proibidas”, nas livrarias existiam livros e discos proibidos no “puto” – denominação de Portugal para quem vivia em Angola. Luanda “convidava”, e nos anos 70, era uma das cidades que mais crescia no mundo. Esse crescimento provinha da riqueza de muitos que, no final do seu serviço militar, ficavam a trabalhar nas centenas de empresas que solicitavam mão-de-obra bem mais paga do que em Portugal, e com muitas mais regalias.
Havia uma dezena de salas de cinema, praticamente com sessões contínuas a partir das 14 horas. Desse lote, uma referência muito especial ao Restauração, com parque infantil e sala onde deixar as crianças, enquanto os pais ou familiares assistiam ao filme.
Em Angola, na realidade, existiam diferenças…
Texto de José Ernesto Costa, com alterações de Anaísa Morais.